O projeto do governo de São Paulo (PL 529/20) vendido como reforma administrativa para cobrir um rombo no orçamento do ano que vem, de R$ 10,4 bi, tem o mérito de tentar resolver problemas de caixa, como enxugamento da estrutura administrativa, realocação de recursos financeiros e melhorias na administração tributária, mas erra a mão na solução real de problemas a enfrentar. Esse pacote, na verdade, vai retirar os recursos do bolso do consumidor com aumento de impostos. Não tem bala de prata ou mágica. Ao invés de mergulhar no corte de gastos e privilégios, o governo vai fazer o cidadão pagar essa conta amarga.
O projeto tem, em um de seus eixos de sustentação, o enxugamento da máquina, que irá reverter em uma pífia economia de 0,2% do Orçamento de R$ 251 bilhões, ou seja, apenas R$ 585 milhões. Já a realocação de recursos financeiros (superávit), em especial das universidades paulistas e da Fapesp, vai incentivar gestores a gastarem mais seus fundos, uma vez que dinheiro investido em pesquisa geralmente é gasto a médio e longo prazos. Se analisarmos os três eixos do PL – o enxugamento da estrutura administrativa; a realocação de recursos financeiros; e o incremento das receitas tributárias, por meio de aumento de impostos disfarçado de “corte de benefícios fiscais” – a conta não fecha.
Com um enxugamento tímido da máquina e transferências de fundos de empresas e autarquias para o Tesouro, pelo menos R$ 4,5 bi – quase metade da economia proposta pelo governo – virá, na verdade, com o aumento de impostos. O truque está embutido no controverso e obscuro artigo 24, que prevê uma autorização para o Executivo reduzir ou manter “benefícios fiscais”. O problema está na definição de ‘benefícios fiscais’ e sua equiparação a qualquer produto ou serviço tributado abaixo da alíquota de 18%.
Na prática, esse dispositivo dá um “cheque em branco” para o Poder Executivo majorar as alíquotas do ICMS que estão abaixo de 18%, sem passar pela Assembleia Legislativa e sem debater com a sociedade. Essa prática é também inconstitucional, já que a instituição ou majoração de tributos só pode ser por meio de lei (art. 150, I), atribuição prevista na Constituição Federal.
Por que este projeto servirá prioritariamente para aumento de impostos? Como sabemos que o Poder Executivo vai, de fato, aumentar o ICMS? Considerando a morosidade dos procedimentos para realizar o ajuste pela despesa, com a venda de ativos e extinção de fundações e autarquias, o que resta para o governo é buscar receita pelo meio mais rápido e eficaz: aumento de impostos.
Já o quarto eixo do projeto, relacionado à reforma administrativa das carreiras dos servidores do estado, na busca de uma estrutura pública mais enxuta e eficiente, não há sinais concretos nesse sentido. Reformas que mantém privilégios e permitem, por meio de penduricalhos, ultrapassar o teto salarial, são inócuas.
A solução da crise não pode estar ancorada no aumento de tributos. Nós precisamos reduzir despesas. E a principal está vinculada ao orçamento de pessoal. Portanto, precisamos de uma reforma administrativa séria e profunda, que retire privilégios e torne o serviço público mais eficiente. Se não houver um mergulho na diminuição de despesas, não há qualquer possibilidade de pensar em aumento de impostos.
Apesar de reconhecer que são oportunas a extinção de alguns órgãos públicos e a reavaliação de fundos e entidades para fazer um ajuste fiscal que dê conta da crise econômica ocasionada pela pandemia da Covid-19, são preocupantes os capítulos relacionados aos impostos estaduais. Em relação ao artigo 24, o discurso do governo tenta convencer que não é um aumento de tributo, mas, sim, redução de benefícios fiscais, na proporção linear de 20% sobre todos os produtos e serviços. No entanto, isso não está escrito no texto da lei. Palavras bonitas e discursos eloquentes não convencem: Precisa estar escrito na Lei. E isso o governo não faz.
Embora o governador tenha prometido não aumentar as alíquotas de ICMS dos produtos da cesta básica e de remédios, não há no projeto de lei qualquer menção a essas promessas. O jogo de palavras pode impressionar ou desviar a atenção para o que está por traz desse projeto atabalhoado. As promessas não estão inseridas no PL 529 e nem as categorias que sofrerão ajustes ou alterações em suas alíquotas. Todos nós serem